Caríssimos irmãos e irmãs em Cristo,
O Evangelho de hoje apresenta-nos uma das parábolas mais incisivas de Jesus: a história do rico que vivia em banquetes e do pobre Lázaro, cheio de feridas, à sua porta. É um texto que nos obriga a olhar para dentro do nosso coração e para a forma como vivemos as relações com os outros.
Notemos, antes de mais, um detalhe: o rico não tem nome, mas o pobre tem. Para Deus, o pobre tem rosto, tem história, tem identidade. Os bens materiais não dão nome nem eternidade a ninguém; só o amor dá. Este é já um primeiro aviso de Jesus: quem vive centrado apenas em si mesmo, no conforto e no consumo, corre o risco de se tornar anónimo para Deus.
Depois, há um abismo que separa o rico de Lázaro. Primeiro, um abismo criado pela indiferença: o rico via Lázaro todos os dias, mas não se aproximava dele. Não o maltratava, não lhe batia, mas também não se compadecia. Não fazer nada pelo outro, quando podemos, é já uma forma de pecado. No fim, esse abismo torna-se eterno: “entre nós e vós está estabelecido um grande abismo”. Aquilo que não construímos em vida — pontes de solidariedade, gestos de misericórdia — não se improvisa depois da morte.
Jesus mostra ainda que a Palavra de Deus é suficiente para nos converter: “Têm Moisés e os Profetas: que os escutem!”. Não precisamos de milagres extraordinários para acreditar nem para mudar de vida. Temos o Evangelho, temos os sacramentos, temos tantos sinais do amor de Deus. O que falta, muitas vezes, é deixar que esta Palavra nos transforme.
Queridos irmãos e irmãs, esta parábola não é apenas um alerta para o juízo final; é um apelo para o hoje. O pobre Lázaro está à nossa porta — nos migrantes, nos sem-abrigo, nos idosos sós, nos jovens sem esperança. Cada um de nós pode fazer algo: um gesto, um sorriso, um tempo partilhado, um pouco dos nossos bens.
Que este Evangelho nos ajude a reconhecer Cristo presente nos pobres e a construir já aqui uma vida que seja sinal do Reino de Deus. Assim, quando chegar a nossa hora, encontraremos o abraço misericordioso do Pai, que nos dirá: “Tive fome e deste-me de comer; era pobre e acolheste-me”.
Que Nossa Senhora, que viveu na simplicidade e confiou em Deus, nos ensine a ter um coração pobre e misericordioso.
Ámen.